DARFUR. Todos lemos uma vez o nome, num jornal, só para vermos a publicidade na página ao lado. E, por vezes (não me recordo bem quando), qualquer coisa, vaga, como a neblina do sebastião, atravessava o telejornal uma vez em cada semestre, se tanto, com a duração máxima estipulada de um minuto, porque, a bem dizer, todos sabemos que as donas de casa e os maridos não gostam de ver pretos a morrerem à fome, para mais há as criancinhas à mesa, estas televisões já não têm sensibilidade nenhuma, não pensam nos mais pequenos, ó filhos, não olheis, mamã, podemos ver os morangos?, sim, filhinhos, isso é que são coisas adequadas para vocês, não isto, já não há respeito pelos momentos de família, à hora do jantar, onde é que isto já se viu. E o pai faz zap. Curiosamente, não tenho qualquer memória da rádio falar da «coisa» (guardemos a designação abstracta para a coisa abjecta, aliás, não conversemos disso, a final do chelsea contra o manchester é que vai ser um grande jogo, não é verdade? [café aos lábios] sim, sim, isso é que vai ser!).
DARFUR. A palavra já nos rebolou pelos ouvidos, como a pedra caída ao poço, e ecoou no seu trapezismo de choque contra as paredes do abismo da memória, só para se sepultar, silenciosa, na água-mãe em que tudo nasce e morre. Hah, os tambores, Pippin, os tambores! A pedra caída e calada regurgita uma horda e um demónio - e não temos um Gandalf e um cachimbo para decidir na minas da (Me)Moria. Acordamos uma coisa mais antiga do que o tempo pelo simples facto que acordamos nós: o mundo é uma perspectiva. A besta ardia já há muito tempo, mas a sonharmos ovelhas, quem diria que o leão, quando acordássemos, o víssemos de mandíbulas abertas a nós? E ele só escancarou as presas porquanto nós escancarámos os olhos.
DARFUR. Vamos, vamos!, arrastemo-nos ao espelho! Transforma o teu espelho numa janela: o material é o mesmo: areia e vidro! Que vês agora? Que olho agora? Há eu não quero ver mais isto, por favor, eu não quero ver mais isto! Não, Alex, tens de continuar o teu tratamento. Por favor, por favor, peço-vos!, imploro-vos, lambo-vos!, eu já não suporto estas imagens de violência, não percebo, mas eu - que as vi e pratiquei mil vezes no meu tempo de juventude - não as suporto mais, não as aguento mais: atlas deixou cair o mundo porque lhe doíam as omoplatas! Não, Alex, tens de continuar o teu tratamento. Isto é para teu bem. Sabes que isto é para teu bem, não sabes? Sim, mas eu não quero mais, por favor, libertem-me, não me podem fazer isto! Deixem-me fechar os olhos! Não, Alex, tens de continuar o teu - o nosso tratamento.
DARFUR. África começou mal, África está mal. Eu nasci em África, quando era somente uma Lucy num céu de diamantes e arqueólogos me descobriam e brincavam comigo nessa minha infância muito remota. Mas hoje eu cuspi sobre a escada que me levou mais alto e rasguei o álbum da tia dulce. Mundo-pietá em que Cristo morto é África! Um dia, uma semana, olhemos! Isto não pode continuar assim. Quando éramos pequenos, houve um genocídio, num underground chamado Balcãs, mas éramos crianças e os Balcãs devia ser aquele sítio na escola a que os mais velhos nos proíbiam de ir (as outras crianças diziam que eles tinham aquele canto para fumarem ou coisas ainda piores jamais desvendadas porque quando eu mesmo me tornei grande andava já noutra escola). A nossa geografia era do tamanho da nossa casa e vila. Mas hoje, hoje, caramba!, somos ou não homens e mulheres? Não temos cabelos bastos e basta barba e seios maduros e lábios vermelhos? Se calhar, temos tudo isso por fora, e não temos nada por dentro. Quando éramos crianças, não tínhamos pena das rãs que púnhamos dentro de garrafas e apanhávamos dos charcos de lama, mas quando entramos para os escuteiros disseram-nos que isso era feio. Onde está a nossa aprendizagem? E hoje não são mais sapos dentro de garrafas, são corpos dentro de caixões (e isto quando escapam à vala comum e a às moscas). Houve um genocídio num tempo em que ainda nem éramos crianças e educaram-nos para repudiarmos vivamente um homem de bigode à Pessoa (pobre Pessoa, o que te havia de acontecer ao bigode!) e tudo quando ele houvera feito: as suásticas eram cruzes sem rip. Pois bem, cuspo-vos a verdade para cima (e entre o tempo em que a saliva paira no ar no seu trajecto, eu movo-me para me juntar a vós e recuperar os seus salpicos sobre o meu rosto): está a acontecer um genocídio! GENOCÍDIO! E nós permitimo-lo. Permitimo-lo, primeiro, pela nossa ignorância, segundo, pela nossa inacção. Ah, também eu era, verdadeiramente, ignorante até há meia hora atrás. Tinah escutado a palavra, mas sabia tanto de lá como sei o nome do primeiro ministro da birmânia que, ao que tenho conhecimento, tem em comum com o nosso não ser engenheiro. Ah, eu agora não sei tudo, mas sei o que preciso de saber! Deus! Eu andava preocupado em não ser ignorante no domínio da banda desenhada e ia mesmo amanhã ao dr.kartoon para o senhor com o qual nunca falei mas me disseram que sabe muito muito muito me aconselhar que livros eu, que só amo corto maltese como uma reencarnação passada, haveria de ler! Argh, eu andava preocupado com esta ignorância e afinal estava a acontecer um genocídio nas minhas barbas que a minha mãe não me deixa crescer e eu não sabia! Que ninguám diga mais que não sabe! Só quando todos souberem podemos, como num vietname, passar à acção e na nossa incapacidade estender o braço e ajudar o que pudermos. Mas primeiro nós temos que saber! É preciso que todos saibam! É necessário que África não seja mais a sarjeta do mundo, o resort turístico a que o primeiro ministo vai passar férias à custa do contribuinte! Sim, é importante conseguirmos a demissão do elefante-besta que é a ministra da educação! Sim, é importante desmascarar a mentira do sorriso falso de crocodilo do filósofo português e a sua engenharia! Sim, é importante acabar com esta nojice que se tornou Portugal! Mas, sim!, é mais importante que tudo isto, é mais importante que nós, acabar com Darfur, acabar com o genocídio de Darfur, acabar com o silêncio ante o genocídio de Darfur! É preciso que se instalem altifalantes nas avenidas das principais cidades e que ciclicamente oiçamos sobre nós os gritos dos órfãos de Darfur, o choro das mães de Darfur, os passos dos deslocados de Dafrur, o ódio dos soldados de Darfur, os suspiros dos mortos de Darfur! É importante que Darfur se torne símbolo do horror, para que se torne símbolo da salvação que foi aportada ao horror. É importante que cada criança na primária diga Darfur e sinta um arrepio na espinha e sinta que tem de agir e sintamos que somos todos crianças outra vez mas o Darfur não é onde ficam os Balcãs é onde fica o Darfur! É onde morrem as crianças que não vão à primária e nunca tiverem uns Balcãs que fosse onde os mais velhos fumavam cigarros às escondidas! Ai, Darfur tem que ser, verdadeiramente, sempre que pronunciado, acompanhado por uma lágrima na mão direita e dedos abertos na mão esquerda. Darfur não pode ser esquecido. Darfur precisa de nós. Temos de provar que somos humanos. Temos de provar a nós mesmos que somos humanos para não chegar ao fim da vida a sermos, a sermos, a sermos nem eu sei o quê! Quem cala, consente; Quem com-sente, não cala.
DARFUR. Esta é a semana Dias Globais por Darfur. O apelo é simples: divulguemos com cada brônquio dos nossos pulmões o genocídio que está a ocorrer no Darfur. Nos nossos blogues coloquemos a pequena imagem que é o símbolo desta campanha e demos a conhecer a nós mesmos e ao mundo que não é mais do que um espelho de nós mesmos (porquanto o mundo é aquilo que nós fazemos dele) o massacre de África. Gostava de, pela minha blogosfera pessoal, encontrar em todos os blogues esta bandeira de grito de munch. Há que soltar um grito imenso, há que berrar um grito imenso, há que gritar um grito imenso!:
DARFUR. Vamos, vamos!, arrastemo-nos ao espelho! Transforma o teu espelho numa janela: o material é o mesmo: areia e vidro! Que vês agora? Que olho agora? Há eu não quero ver mais isto, por favor, eu não quero ver mais isto! Não, Alex, tens de continuar o teu tratamento. Por favor, por favor, peço-vos!, imploro-vos, lambo-vos!, eu já não suporto estas imagens de violência, não percebo, mas eu - que as vi e pratiquei mil vezes no meu tempo de juventude - não as suporto mais, não as aguento mais: atlas deixou cair o mundo porque lhe doíam as omoplatas! Não, Alex, tens de continuar o teu tratamento. Isto é para teu bem. Sabes que isto é para teu bem, não sabes? Sim, mas eu não quero mais, por favor, libertem-me, não me podem fazer isto! Deixem-me fechar os olhos! Não, Alex, tens de continuar o teu - o nosso tratamento.
DARFUR. África começou mal, África está mal. Eu nasci em África, quando era somente uma Lucy num céu de diamantes e arqueólogos me descobriam e brincavam comigo nessa minha infância muito remota. Mas hoje eu cuspi sobre a escada que me levou mais alto e rasguei o álbum da tia dulce. Mundo-pietá em que Cristo morto é África! Um dia, uma semana, olhemos! Isto não pode continuar assim. Quando éramos pequenos, houve um genocídio, num underground chamado Balcãs, mas éramos crianças e os Balcãs devia ser aquele sítio na escola a que os mais velhos nos proíbiam de ir (as outras crianças diziam que eles tinham aquele canto para fumarem ou coisas ainda piores jamais desvendadas porque quando eu mesmo me tornei grande andava já noutra escola). A nossa geografia era do tamanho da nossa casa e vila. Mas hoje, hoje, caramba!, somos ou não homens e mulheres? Não temos cabelos bastos e basta barba e seios maduros e lábios vermelhos? Se calhar, temos tudo isso por fora, e não temos nada por dentro. Quando éramos crianças, não tínhamos pena das rãs que púnhamos dentro de garrafas e apanhávamos dos charcos de lama, mas quando entramos para os escuteiros disseram-nos que isso era feio. Onde está a nossa aprendizagem? E hoje não são mais sapos dentro de garrafas, são corpos dentro de caixões (e isto quando escapam à vala comum e a às moscas). Houve um genocídio num tempo em que ainda nem éramos crianças e educaram-nos para repudiarmos vivamente um homem de bigode à Pessoa (pobre Pessoa, o que te havia de acontecer ao bigode!) e tudo quando ele houvera feito: as suásticas eram cruzes sem rip. Pois bem, cuspo-vos a verdade para cima (e entre o tempo em que a saliva paira no ar no seu trajecto, eu movo-me para me juntar a vós e recuperar os seus salpicos sobre o meu rosto): está a acontecer um genocídio! GENOCÍDIO! E nós permitimo-lo. Permitimo-lo, primeiro, pela nossa ignorância, segundo, pela nossa inacção. Ah, também eu era, verdadeiramente, ignorante até há meia hora atrás. Tinah escutado a palavra, mas sabia tanto de lá como sei o nome do primeiro ministro da birmânia que, ao que tenho conhecimento, tem em comum com o nosso não ser engenheiro. Ah, eu agora não sei tudo, mas sei o que preciso de saber! Deus! Eu andava preocupado em não ser ignorante no domínio da banda desenhada e ia mesmo amanhã ao dr.kartoon para o senhor com o qual nunca falei mas me disseram que sabe muito muito muito me aconselhar que livros eu, que só amo corto maltese como uma reencarnação passada, haveria de ler! Argh, eu andava preocupado com esta ignorância e afinal estava a acontecer um genocídio nas minhas barbas que a minha mãe não me deixa crescer e eu não sabia! Que ninguám diga mais que não sabe! Só quando todos souberem podemos, como num vietname, passar à acção e na nossa incapacidade estender o braço e ajudar o que pudermos. Mas primeiro nós temos que saber! É preciso que todos saibam! É necessário que África não seja mais a sarjeta do mundo, o resort turístico a que o primeiro ministo vai passar férias à custa do contribuinte! Sim, é importante conseguirmos a demissão do elefante-besta que é a ministra da educação! Sim, é importante desmascarar a mentira do sorriso falso de crocodilo do filósofo português e a sua engenharia! Sim, é importante acabar com esta nojice que se tornou Portugal! Mas, sim!, é mais importante que tudo isto, é mais importante que nós, acabar com Darfur, acabar com o genocídio de Darfur, acabar com o silêncio ante o genocídio de Darfur! É preciso que se instalem altifalantes nas avenidas das principais cidades e que ciclicamente oiçamos sobre nós os gritos dos órfãos de Darfur, o choro das mães de Darfur, os passos dos deslocados de Dafrur, o ódio dos soldados de Darfur, os suspiros dos mortos de Darfur! É importante que Darfur se torne símbolo do horror, para que se torne símbolo da salvação que foi aportada ao horror. É importante que cada criança na primária diga Darfur e sinta um arrepio na espinha e sinta que tem de agir e sintamos que somos todos crianças outra vez mas o Darfur não é onde ficam os Balcãs é onde fica o Darfur! É onde morrem as crianças que não vão à primária e nunca tiverem uns Balcãs que fosse onde os mais velhos fumavam cigarros às escondidas! Ai, Darfur tem que ser, verdadeiramente, sempre que pronunciado, acompanhado por uma lágrima na mão direita e dedos abertos na mão esquerda. Darfur não pode ser esquecido. Darfur precisa de nós. Temos de provar que somos humanos. Temos de provar a nós mesmos que somos humanos para não chegar ao fim da vida a sermos, a sermos, a sermos nem eu sei o quê! Quem cala, consente; Quem com-sente, não cala.
DARFUR. Esta é a semana Dias Globais por Darfur. O apelo é simples: divulguemos com cada brônquio dos nossos pulmões o genocídio que está a ocorrer no Darfur. Nos nossos blogues coloquemos a pequena imagem que é o símbolo desta campanha e demos a conhecer a nós mesmos e ao mundo que não é mais do que um espelho de nós mesmos (porquanto o mundo é aquilo que nós fazemos dele) o massacre de África. Gostava de, pela minha blogosfera pessoal, encontrar em todos os blogues esta bandeira de grito de munch. Há que soltar um grito imenso, há que berrar um grito imenso, há que gritar um grito imenso!:
darf ui ui ui ui ui ui ur!
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