terça-feira, março 14, 2006

Moleskines §1: Penélopes

Sem nome decente para a intervenção, fiz o que sempre faço nestas ocasiõe: vou à velha grega mitologia requisitar um nome que, de alguma forma, possa interligar com o que escrevo. Sem plano definido para este rascunho, via, quando o projectava mentalmente concluído, nele um entrelaçar de temas que, invariavelmente, me recordou a teia e o tear - e, com elas, Pénelope.
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Ontem, quiseram forçar-me a fazer a barba. Símbolo viril por excelência, não que a me por isso, mas porque me sinto nu sem ela, rente ou desenvolta esteja. Face à minha oposição ao apelo que me fizeram para a limpar (se algo a limpar há numa mera cobertura parca que nem uma semana tem e só acinzenta o rosto), disseram-me que não arranjasse confusões e que contribuísse para um bom ambiente, não irritando os outros. Estranho que a vontade a ceder seja, invariavelmente, a nossa, que nunca sejam os outros a tentarem não irritar-me (se eu me irritasse, coisa que já não pratico, de tão supérfluo que é). Invariavelmente também, as pessoas não sabem inverter o ângulo e foco dos seus argumentos: se o fizessem, talvez me deixassem a barba solta, e, em vez de pedirem a que outros cedam a vontade, cedessem eles a sua. De qualquer das formas, não fiz a dita cuja. Quem souber ler metáforas e hipónimos, que os leia.

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Acabei de ver o início do concerto, em 1970, dos Led Zeppelin no Royal Albert Hall. Só vi as duas primeiras músicas, mas tenho de destacar a "I Can't Quit You Baby". Ainda que se tenha vindo a descobrir que esta música do CD de estreia era um cover de outro artista, a música foi de tal forma alterada e é tão magistralmente trabalhada pela banda que perdeu a sua autoria original, para passar a ser, na acepção plena, uma outra obra-prima dos Led Zeppelin. Magnífico o espectáculo, os impressionantes solos de guitarra do Jimmy Page nesta rock-blues. E, ainda que curto, o solo do baterista Bonham marca igualmente, ainda que todo o acompanhamento ao longo da música não nos permita, jamais, esquecê-lo, com a sua batida poderosa, lembrando aquele verso de Álvaro de Campos "À dolorosa luz das grandes lâmpadas [...] Tenho febre e toco bateria", seja-nos permitido emendar, pois é, de facto, fervilhante a energia que ele transparece . Fenomenal - e perdoem-me a escassez de palavras, mas elas não existem face à grandiosidade, quase de Alexandre, da composição.

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